Constituição Federal de 1891

Constituição Federal de 1891

*Por Philippe Raposo

Um ano após a proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, o Governo Provisório nomeou uma Comissão especial para elaborar o projeto de Constituição que seria apresentado ao Congresso. A comissão foi composta por Joaquim Saldanha Marinho, signatário do Manifesto Republicano de 1870, que foi escolhido presidente da Comissão; os republicanos históricos Américo Brasiliense, Francisco Rangel Pestana e os juristas Antônio Luís dos Santos Werneck e José Antônio Pedreira de Magalhães Castro. Iniciados os trabalhos, três foram os anteprojetos elaborados, todos reduzidos a um só, inspirado nas constituições dos Estados Unidos e da Argentina. Foi entregue, em 30 de maio de 1890, ao Governo, que realizou minuciosa revisão, efetuada, em especial, por Rui Barbosa, responsável por consolidar a versão final. Em 22 de junho de 1890 era aprovado o projeto.

O Congresso Constituinte foi convocado por decreto de 21 de dezembro de 1889, para reunir-se no dia 15 de novembro de 1890. Depois de pouco mais de três meses, em 24 de fevereiro de 1891, foi solenemente promulgada a Constituição republicana.

A primeira Constituição republicana brasileira inspirou-se na organização política norte-americana. Foram abolidas as principais instituições monárquicas, como o Poder Moderador, o Conselho de Estado e a vitaliciedade do Senado. Foi introduzido o sistema de governo presidencialista. O poder dos estados federativos (ex-províncias) foi significativamente ampliado com a introdução do princípio federalista. Foi abolida a religião oficial com a separação entre o Estado e a Igreja Católica. O Federalismo seria a chave para fortalecer as oligarquias regionais.

De acordo com uma disposição transitória da Constituição de 1891, o Presidente e o Vice-Presidente do primeiro mandato deveriam ser excepcionalmente eleitos pelo Congresso Constituinte.

Abaixo, listamos os principais dispositivos da CF/1891.

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (1891)

“Nós, os representantes do povo brasileiro, reunidos em Congresso Constituinte, para organizar um regime livre e democrático, estabelecemos, decretamos e promulgamos a seguinte Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil”.

Art 1º – A Nação brasileira adota como forma de Governo, sob o regime representativo, a República Federativa, proclamada a 15 de novembro de 1889, e constitui-se, por união perpétua e indissolúvel das suas antigas Províncias, em Estados Unidos do Brasil.

Art 2º – Cada uma das antigas Províncias formará um Estado e o antigo Município Neutro constituirá o Distrito Federal, continuando a ser a Capital da União.

Art 3º – Fica pertencendo à União, no planalto central da República, uma zona de 14.400 quilômetros quadrados, que será oportunamente demarcada para nela estabelecer-se a futura Capital federal.

Art 7º – É da competência exclusiva da União decretar: 1º) impostos sobre a importação de procedência estrangeira;

Art 9º – É da competência exclusiva dos Estados decretar: 1º) impostos sobre a exportação de mercadorias de sua própria produção; *Este é o mais emblemático dos dispositivos que evidenciam a descentralização político-administrativa instituída pela CF/1891, conferindo autonomia aos estados federativos. Caberia a esses, cuja política era influenciada pelas oligarquias cafeeiras, decidirem acerca da tributação sobre as suas exportações.

Art 11, par. 2º – É vedado aos Estados, como à União estabelecer, subvencionar ou embaraçar o exercício de cultos religiosos. *O Estado torna-se laico, a partir da CF/1891, orientação coerente com a própria filosofia positivista que inspira a ordem republicana recém-instaurada.

Art 15 – São órgãos da soberania nacional o Poder Legislativo, o Executivo e o Judiciário, harmônicos e independentes entre si.

Art 16 – § 1º – O Congresso Nacional compõe-se de dois ramos: a Câmara dos Deputados e o Senado Federal.

Art 28 – A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo eleitos pelos Estados e pelo Distrito Federal, mediante o sufrágio direto.

Art 30 – O Senado compõe-se de cidadãos elegíveis (…), em número de três Senadores por Estado e três pelo Distrito Federal, eleitos pelo mesmo modo por que o forem os Deputados.

Art 43 – O Presidente exercerá o cargo por quatro anos, não podendo ser reeleito para o período presidencial imediato.

Art 47 – O Presidente e o Vice-Presidente da República serão eleitos por sufrágio direto da Nação e maioria absoluta de votos.

Art 63 – Cada Estado reger-se-á pela Constituição e pelas leis que adotar, respeitados os princípios constitucionais da União.

Art 69 – São cidadãos brasileiros: (…) os estrangeiros, que se achando no Brasil aos 15 de novembro de 1889, não declararem, dentro em seis meses depois de entrar em vigor a Constituição, o ânimo de conservar a nacionalidade de origem. *Trata-se do dispositivo constitucional referente à GRANDE NATURALIZAÇÃO, segundo a qual a nacionalidade brasileira seria automaticamente conferida a todos os estrangeiros residentes no Brasil que, no prazo de seis meses, não se manifestassem de modo contrário.

Art 70 – São eleitores os cidadãos maiores de 21 anos que se alistarem na forma da lei. § 1º – Não podem alistar-se eleitores para as eleições federais ou para as dos Estados: 1º) os mendigos; 2º) os analfabetos; 3º) as praças de pré, excetuados os alunos das escolas militares de ensino superior; 4º) os religiosos de ordens monásticas, companhias, congregações ou comunidades de qualquer denominação, sujeitas a voto de obediência, regra ou estatuto que importe a renúncia da liberdade individual. *A exigência de que os eleitores fossem homens (exclusão implícita do voto das mulheres) e alfabetizados excluía a maioria absoluta da população do processo político-eleitoral.

Art.72 § 2º A Republica não admite privilégios de nascimento, desconhece foros de nobreza, e extingue as ordens honoríficas existentes e todas as suas prerrogativas e regalias, bem como os títulos nobiliárquicos e de conselho. *Alguns títulos foram mantidos pelo governo republicano a título de homenagem, dentre os quais se incluem o título de Barão do Rio Branco, concedido a José Maria da Silva Paranhos Júnior, em 1888, às vésperas do fim do período imperial.

  • 6º Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos.
  • 7º Nenhum culto ou igreja gozará de subvenção oficial, nem terá relações de dependência ou aliança com o Governo da União, ou o dos Estados. A representação diplomática do Brasil junto à Santa Sé não implica violação deste principio. 

Art 88 – Os Estados Unidos do Brasil, em caso algum, se empenharão em guerra de conquista, direta ou indiretamente, por si ou em aliança com outra nação.

DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS

Art 1º – Promulgada a Constituição, o Congresso, reunido em Assembleia Geral, elegerá em seguida, por maioria absoluta de votos, (…) o Presidente e o Vice-Presidente dos Estados Unidos do Brasil. *A 1ª eleição presidencial foi indireta, realizada pelo Congresso Nacional.

Art 7º – É concedida a D. Pedro de Alcântara, ex-Imperador do Brasil, uma pensão que, a contar de 15 de novembro de 1889, garanta-lhe, por todo o tempo de sua vida, subsistência decente. O Congresso ordinário, em sua primeira reunião, fixará o quantum desta pensão.

Art 8º – O Governo federal adquirirá para a Nação a casa em que faleceu o Doutor Benjamin Constant Botelho de Magalhães e nela mandará colocar uma lápide em homenagem à memória do grande patriota – o fundador da República.

EMENDA CONSTITUCIONAL DE 1926

Durante grande parte da Primeira República (1889-1930) desenvolveu-se um intenso debate sobre a necessidade de reformar a Constituição de 1891. Muitos reformadores defendiam a ampliação dos poderes da União como forma de enfrentar as pressões dos grupos regionais. A Emenda Constitucional de 1926 iria, em parte, atender a essas demandas centralizadoras. A Revolução de 1930 encerraria o período de vigência dessa primeira Carta republicana e aboliria, de fato, a autonomia dos Estados.

*Philippe Raposo é professor de Direito Interno do IDEG.